segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

O menino - Fabris Rendelli

O menino sem querer viu o céu, desconcertando-se de grandeza. Viu que o tempo era um fragmento de nossa lendária eternidade e que não há diferença entre o primeiro e o último suspiro. As estrelas iluminavam-lhe a morte de forma tão precisa que, sem querer, percebeu-se festejando a vida intensamente. Embriagado de desejo, enfiou as mãos na areia para sorver a voz espalhada pelo pó e vindas de tantas bocas. O dia seguiria surgindo inevitavelmente, ascendendo e apagando gerações inteiras, infectando de luz nossas trevas cotidianas. 


O menino que olhava o céu, desconcertado de grandeza, amava em silêncio o instante sempre perdido.

Os girassóis de ontem - Fabris Rendelli


E cada vez mais longe, cada vez mais distante, perdida e consumida, sabe que dia menos dia estará sozinha e só terá seus vermes como companhia para suas longas noites nas quais chorara o abandono de tanta gente, incluindo a si mesma. Ela se queimará por febres sombrias nos umbrais da velhice, onde a lembrança mais terna se resumirá na fantasia do que poderia ter sido e não foi. E uma multidão de bichos explodirá de sua solidão para chegar até a última luz de sua vida, que teimosa haverá poupado por todo o tempo, inutilmente. Centenas de milhares de bigatos de todo asco, repulsa e fuga, farão de seu coração seco e morto sua última morada.