segunda-feira, 30 de abril de 2012

Haydn - String Quartet in D Minor "Fifths" - Mov. 1/4


Henry Purcell-Sound the trumpet-Andreas Scholl-Christophe Dumaux


Ciência ínfima - Antero de Quental



Onde o grande caminho soberano
Da Ciência que abriu a nova era,
Investigando a entranha da monera,
A desvendar-se no capricho insano?
Ciência que se elevou à estratosfera
E devassou os fundos do oceano,
Fomentando o princípio desumano
Da ambição onde a força prolifera...

Ciência de ostentação, arma de efeito,
Longe da Luz, da Paz e do Direito,
Num caminho infeliz, sombrio e inverso;

Sob o alarme guerreiro, formidando,
Eis que a Terra te acusa, soluçando,
Como a Grande Mendiga do Universo!...





Antero de Quental, que nasceu na ilha de São Miguel, nos Açores, em 1842, e desencarnou em 1891, é vulto eminente e destacado nas letras portuguesas, em que se caracterizou por seu espírito filosófico. O soneto acima, psicografado por Francisco Cândido Xavier, integra o Parnaso de Além Túmulo, obra publicada pela FEB em julho de 1932.

Nando Reis - Pra Você Guardei O Amor


domingo, 29 de abril de 2012

Tchaikovsky - Lake in the Moonlight


Nirvana > Antero de Quental



Viver assim: sem ciúmes, sem saudades, 
Sem amor, sem anseios, sem carinhos, 
Livre de angústias e felicidades, 
Deixando pelo chão rosas e espinhos; 

Poder viver em todas as idades; 
Poder andar por todos os caminhos; 
Indiferente ao bem e às falsidades, 
Confundindo chacais e passarinhos; 

Passear pela terra, e achar tristonho 
Tudo que em torno se vê, nela espalhado; 
A vida olhar como através de um sonho; 

Chegar onde eu cheguei, subir à altura 
Onde agora me encontro - é ter chegado 
Aos extremos da Paz e da Ventura! 

Antero de Quental, in "Sonetos"

É Preciso Aprender a Amar - Friedrich Nietzsche


Que se passa para nós no domínio musical? Devemos em primeiro lugar aprender a ouvir um motivo, uma ária, de uma maneira geral, a percebê-lo, a distingui-lo, a limitá-lo e isolá-lo na sua vida própria; devemos em seguida fazer um esforço de boa vontade — para o suportar, mau-grado a sua novidade — para admitir o seu aspecto, a sua expressão fisionômica — e de caridade — para tolerar a sua estranheza; chega enfim o momento em que já estamos afeitos, em que o esperamos, em que pressentimos que nos faltaria se não viesse; a partir de então continua sem cessar a exercer sobre nós a sua pressão e o seu encanto e, entretanto, tornamo-nos os seus humildes adoradores, os seus fiéis encantados que não pedem mais nada ao mundo, senão ele, ainda ele, sempre ele. 
Não sucede assim só com a música: foi da mesma maneira que aprendemos a amar tudo o que amamos. A nossa boa vontade, a nossa paciência, a nossa equanimidade, a nossa suavidade com as coisas que nos são novas acabam sempre por ser pagas, porque as coisas, pouco a pouco, se despojam para nós do seu véu e apresentam-se a nossos olhos como indizíveis belezas: é o agradecimento da nossa hospitalidade. Quem se ama a si próprio aprende a fazê-lo seguindo um caminho idêntico: existe apenas esse. O amor também deve ser aprendido. 

Friedrich Nietzsche, in "A Gaia Ciência"

sábado, 28 de abril de 2012

Beauty Song Dance - House of Flying Daggers


马友友,谭盾--Green Destiny -Love Theme.flv


Rita Lee e Roberto de Carvalho - Reza


What a wonderful world - LOUIS ARMSTRONG.


Strangers in The Night - Frank Sinatra


Edith Piaf - La vie en rose - Paroles ( lyrics )


quinta-feira, 26 de abril de 2012

Fatalismo Russo - Friedrich Nietzsche, Ecce Homo


«Ausência de ressentimento, lucidez sobre a natureza do ressentimento, - quem sabe se as não devo também à minha grande doença! O problema não é simples: supõe uma experiência, experiência conseguida a partir da força e também a partir da fraqueza. Se alguma coisa podemos objecar ao estado de doença, é que o verdadeiro instinto de cura enfraquece e, no homem, tal instinto é um autêntico instinto de defesa. Não chegamos a desembaraçar-nos de nada; de nada nos libertamos. Tudo nos fere. Homens e coisas surgem em proximidade indiscreta; tudo quanto nos acontece deixa marcas profundas, a recordação é uma ferida purulenta.
Estar doente é propriamente uma forma de ressentimento. Contra tudo isto há um grande remédio, e um só, e eu chamo-lhe o «fatalismo russo», esse fatalismo sem revolta de que está impregnado o soldado russo que, depois de queixar-se da dureza da campanha, acaba por deitar-se em plena neve. Não tomar mais remédios, renunciar a absorver seja o que for, não reagir em caso algum... A grande razão deste fatalismo, que não é sempre, e só, valentia perante a morte, deste fatalismo conservador da vida na sua contingência mais perigosa, é o abaixamento das funções do metabolismo, o seu retardamento, uma espécie de desejo do sono hibernal. Alguns passos mais nesta lógica e ter-se-á o faquir que dorme semanas num esquife"

A flor e a náusea - Carlos Drummond de Andrade


Preso à minha classe e a algumas roupas,
vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias espreitam-me.
Devo seguir até o enjôo?
Posso, sem armas, revoltar-me?
Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre
fundem-se no mesmo impasse.
Em vão me tento explicar, os muros são surdos.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase.
Uma flor nasceu na rua!
Vomitar esse tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema
resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres mas levam jornais
E soletram o mundo, sabendo que o perdem.
Crimes da terra, como perdoá-los?
Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves, que ajudam a viver.
Ração diária de erro, distribuída em casa.
Os ferozes padeiros do mal.
Os ferozes leiteiros do mal.
Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.
Ao menino de 1918 chamavam anarquista.
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima.
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.
Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.
Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.

Metempsicose - Antero de Quental



Ardentes filhas do prazer, dizei-me!
Vossos sonhos quais são, depois da orgia?
Acaso nunca a imagem fugidia
do que fostes, em vós se agita e freme?

Noutra vida e outra esfera, onde geme
outro vento, e se acende um outro dia,
que corpo tínheis? Que matéria fria
vossa alma incendiou, com fogo estreme?

Vós fostes nas florestas bravas feras,
arrastando, leoas ou panteras,
de dentadas d'amor um corpo exangue...

Mordei pois esta carne palpitante,
feras feitas de gaze flutuante...
Lobas! Leoas! sim, bebei meu sangue!

Antero de Quental
(1842-1891)

terça-feira, 24 de abril de 2012

Bachianas Brasileiras nº 5-Vila-Lobos .mp4


Bach - Christmas Oratorio, BWV 248




The Christmas Oratorio (German: Weihnachtsoratorium) BWV 248, is an oratorio by Johann Sebastian Bach intended for performance in church during the Christmas season. It was written for the Christmas season of 1734 incorporating music from earlier compositions, including three secular cantatas written during 1733 and 1734 and a now lost church cantata, BWV 248a. The date is confirmed in Bach's autograph manuscript. The next performance was not until 17 December 1857 by the Sing-Akademie zu Berlin under Eduard Grell. The Christmas Oratorio is a particularly sophisticated example of parody music. The author of the text is unknown, although a likely collaborator was Christian Friedrich Henrici (Picander).

sexta-feira, 20 de abril de 2012

No outono - Georg Trakl



Junto à cerca, os girassóis e seu brilho,
Doentes sentados ao sol, sem alento.
No campo, as mulheres cantam no trabalho,
Ouvem-se ao longe os sinos do convento.

Os pássaros contam lendas de encantar,
Ouvem-se ao longe os sinos do convento.
Há um violino no pátio a gemer.
E já o vinho escuro vão recolhendo.

Todos parecem felizes, libertos,
E já o vinho escuro vão recolhendo.
Os jazigos dos mortos estão abertos,
Pintados pelo sol que vai entrando.


(tradução: João Barrento)

Isto - Caesar Abraham Vallejo


Sucedeu
isto entre duas pálpebras; tremi
no ventre, colérico, alcalino,
parado junto ao equinócio lúbrico
ao pé do frio incêndio que me devasta.

O resvalo alcalino, digo,
mais perto do alho, sobre o sentido da calda,
no interior da ferrugem,
no ir da água e no rolar da onda.

O resvalo alcalino, também,
era enorme na montagem colossal
do céu.

Que dardos e arpões lançarei, se morrer
no ventre hei de dar em folhas de plátano sagrado
meus cinco ossos subalternos,
e no olhar o próprio olhar!

(Dizem que nos suspiros criam-se
acordeões ósseos, táteis;
dizem que quando morrem os que se acabam assim,
falecem fora do relógio, a mão
a segurar um sapato solitário)

Compreendendo tudo, coronel,
e tudo no sentido lastimável desta voz
castigo-me: extraio tristemente
durante a noite, as minhas próprias unhas
depois não possuo nada e falo sozinho,
inspeciono os semestres
e para encher as minhas vértebras, toco-me.

OUVE a massa, o teu cometa, escutai-os, não venhas carpir
a memória, gravíssimo cetáceo;
ouve a túnica com que estás sonâmbulo,
ouve a tua nudez, detentora do sonho.

Narra-te segurando
a cauda de fogo e os chifres
em que acaba a crina do rasto atroz;
rompe-te em círculos,
forma-te, mas em colunas curvas
descreve-te atmosférico, ser vaporoso,
ao passo reforçado do esqueleto.

A morte? Impugna todo o vestido!
A vida? Obsta parte da tua morte!
Fera venturosa, pensa,
deus desgraçado, despoja-te da fronteira.
Falaremos em breve.

(Trad. Jorge Henrique Bastos)

Jurame y Alma llanera




1st PART: Jurame de Maria Grever

2nd PART: Alma Llanera de Pedro Elias Gutierrez

Los Angeles Philharmonic Orchestra
Gustavo Dudamel, Music Director
Juan Diego Flores, Tenor

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Revolução Francesa


Trata-se de uma vídeo-aula (documentário) produzido atráves de imagens, explicações, vídeos e narrações sobre como se desenvolveu a Revolução Francesa. Tal material foi produzido para ser usado como recurso didático em sala nas aulas de História. O mesmo objetiva abordar temas variados, tais como: o contexto histórico da França antes da revolução, a política adotada pelo Rei Luís XVI, os três Estados que formavam a pirâmide social da França no século XVIII, a insatisfação do povo contra os privilégios consedidos ao Clero e a Nobreza, a queda da "Bastilha" prisão símbolo do absolutismo francês, a Assembléia dos Estados Gerais, os líderes revolucionários "Robespierre, Danton e o jornalista Marat", a constituição da França, demoninada de Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, os grupos revolucionários "Jacobinos e Girondinos", a fase do "Terror" marcada pela máquina da democracia a Guilhotina, o período do "Diretório", o "Golpe 18 do Brumário", Napoleão Bonaparte e as ideias iluministas que conduziram a revolução.

J.B. Lully - Aria de "La Princesse de l'Elide" / Carlos Jaime (violín barroco)


sábado, 14 de abril de 2012

"The Girl from Ipanema" Astrud Gilberto, João Gilberto and Stan Getz


French Baroque Song: Le Roi a fait battre Tambour (1750 c.) / Le Poème Harmonique


Marin Marais - Semele (Chaconne)


Esboço de uma Serpente - Paul Valery



Entre a árvore, a brisa acalenta 
a víbora que hei de vestir; 
um sorriso, que o dente espeta 
e de apetites vem luzir, 
sobre o jardim se arrisca e vaga, 
e o meu triângulo de esmeralda 
atrai a língua do réptil... 
Besta sou, porém besta arguta, 
cujo veneno, embora vil, 
deixa longe a sábia cicuta!

Suave é este tempo de prazer! 
Tremei, mortais, ao meu valor 
quando, sem me satisfazer, 
bocejo e quebro o meu torpor! 
A esplendidez do azul aguça 
esta cobra que me rebuça 
de uma animal simplicidade: 
vinde a mim, ó raça aturdida! 
Que estou prestes e decidida, 
semelhante à necessidade!

Ó Sol, ó Sol!... Falta estupenda! 
Tu que mascaras o morrer, 
sob o azul e o ouro de uma tenda 
onde as flores vão se acolher; 
em meio a mil delícias baças, 
tu, o mais feroz dos meus comparsas, 
dos meus ardis o mais perfeito, 
aos corações não deixas ver 
que este universo é só um defeito 
na puridade do Não-Ser!

Ó Sol, que soas as matinas 
do ser, e em fogos o acompanhas, 
que num fatal sono o arrepanhas 
todo pintado de campinas, 
fautor de fantasmas risíveis 
que prendes às coisas visíveis 
a presença obscura da alma, 
sempre me agradou a mentira 
que tu sobre o absoluto espalhas, 
rei das sombras tornado pira!

A mim o teu calor brutal, 
onde a minha preguiça gelada 
vem devanear sobre algum mal 
próprio à minha índole enlaçada... 
Este amável lugar me seduz 
onde cai a carne e produz! 
Aqui meu furor amadura; 
e eu o aconselho, e eu o refaço, 
e me escuto, e em meio aos meus laços 
minha meditação murmura...

Ó Vaidade! Causa primeira, 
que domina os Céus e os conduz, 
de uma voz que já foi a luz 
abrindo o cosmo sem fronteira! 
Lasso de Seu puro espetáculo, 
o próprio Deus rompeu o obstáculo 
de tão perfeita eternidade; 
ele se fez O que dispersa 
em conseqüências Seu começo, 
em estrelas Sua Unidade.

O Céu, Seu erro! E o Tempo, a ruína! 
E o abismo animal alargado! 
Queda naquilo que origina, 
fagulha em vez do puro nada! 
Mas o primeiro som do Seu Verbo, 
EU!... dos astros o mais soberbo 
que disse o louco criador – 
eu sou!... Eu serei... E ilumino 
esse diminuir divino 
dos fogos do grão Sedutor!

Radioso objeto de minha ira, 
Tu, que amei de um amor flamante, 
e que da geena decidiste 
conceder o império a este amante, 
nos meus escuros Te remira! 
Que ao veres Teu reflexo triste, 
troféu do meu espelho negro, 
tenhas tão funda comoção, 
que sobre a argila o Teu ofego 
seja um suspiro de aflição!

Em vão moldaste nessa lama 
a prole dos fáceis infantes 
que dos Teus atos triunfantes 
a eterna louvação proclama! 
Tão logo secos – e perfeitos, 
são da Serpente já desfeitos, 
filhos que o Teu criar produz. 
Olá, lhes diz, recém-chegados! 
Homens que sois, e andais tão nus, 
animais brancos e abençoados!

Odeio-vos, que do execrado 
à semelhança fostes feitos, 
tal como ao Nome que tem criado 
esses prodígios imperfeitos! 
Eu sou o agente da mudança, 
retoco o peito que se afiança, 
de um dedo exato e misterioso! 
Transformaremos essas obras 
e as evasivas, moles cobras 
em répteis negros, furiosos!

Meu intelecto inumerável 
toca no humano coração 
o instrumento de minha raiva, 
que foi feito por Tua mão! 
E Tua Paternidade alada, 
todo aquele que, na estrelada 
câmara ela acolha que a afague, 
sempre o excesso dos meus assaltos 
lhe traga uns longes sobressaltos 
que seus propósitos estrague!

Vou e venho, deslizo, enfronho, 
desapareço em peito puro! 
Houve jamais seio tão duro 
onde não possa entrar um sonho? 
Quem quer que sejas, não sou esta 
complacência que te requesta 
a alma, desde que ela se ame ? 
Ao fundo sou de seu favor 
este inimitável sabor 
que de ti em ti se derrame!

Eva! que eu tenho surpreendido 
em seus primeiros pensamentos, 
o lábio aos hálitos rendido 
que das rosas se evolam lentos. 
Quão perfeita me apareceu, 
de ouro coberto o flanco seu, 
sem temor ao sol nem ao homem; 
ofertada aos olhos da brisa, 
a alma ainda estúpida, tal como 
perplexa ante a carne, indecisa.

Oh, massa de beatitude, 
és tão bela, prêmio veraz 
para toda a solicitude 
das almas boas e das más! 
Para que aos lábios teus se prendam, 
basta que a um sopro teu se rendam! 
Tornam-se piores os mais puros, 
logo se ferem os mais duros... 
Também a mim teus dons encantam, 
de quem vampiros se levantam!

Sim! De meu posto entre a folhagem – 
réptil que de ave se fingia –, 
enquanto a minha pabulagem 
uma armadilha te tecia, 
eu te bebi, surda beldade! 
Prenhe de encanto e claridade, 
eu dominava, sem tremer, 
fixo o olho em tua lã dourada, 
tua nuca obscura e carregada 
dos segredos do teu mover!

Presente estive, qual odor 
que a alguma ideia corresponda, 
cujo fundo, insidioso negror 
não se elucida nem se sonda! 
Pois eu te inquietava, ó candura, 
carne molemente segura, 
sem ter de mim nenhum temor, 
a tremer em teu esplendor! 
Logo eu te tinha, eu te levava, 
e tua nuança variava!

(A soberba simplicidade 
demanda infinitos cuidares! 
Sua transparência de olhares, 
tolice, orgulho, felicidade 
guardam bem a bela cidade! 
Procuremos criar-lhe azares, 
e traga o mais raro artifício 
ao peito puro o seu motim. 
Eis minha força, o meu ofício, 
a mim os meios do meu fim!)

Ora, de uma baba ofuscante 
fiemos os suaves assaltos 
que façam com que Eva, hesitante, 
se envolva em vagos sobressaltos. 
Que sob a seda da surpresa 
palpite a pele dessa presa, 
acostumada ao azul puro!... 
Mas de gaze nem uma trama, 
nem fio invisível, seguro, 
além da que meu estilo trama!

E ditos, língua, redourados, 
dá-lhe os mais doces que conheças! 
Alusões, fábulas, finezas, 
e mil silêncios cinzelados, 
emprega tudo o que a seduza: 
nada que a não bajule e induza 
a se perder nas minhas vias, 
dócil aos declives que guiam 
para o fundo das azuis bacias 
os veios que nos céus se criam.

Oh, quanta prosa sem parelha, 
quanto espírito não recoso 
e lanço ao dédalo sedoso 
dessa maravilhosa orelha! 
Penso: lá nada é sem proveito, 
tudo importa ao suspenso peito! 
O triunfo é certo, se o propor, 
da alma espreitando algum tesouro, 
como uma abelha a alguma flor, 
não deixa mais a orelha de ouro!

“Só o que o meu sopro lhe confere, 
a ela, é a própria voz divina! 
Uma ciência viva fere 
o corpo do fruto maduro! 
Não ouças o Ser velho e puro 
que a breve mordida abomina! 
Que, se a boca se põe a sonhar, 
a sede que à seiva se atreva, 
esta delícia por chegar, 
é a eternidade fundente, Eva!”

Ela bebeu minha mensagem, 
que tecia um estranho arranjo; 
seu olho perdeu algum anjo 
por penetrar minha ramagem. 
O mais hábil dos animais 
que se ri de seres tão dura, 
ou pérfida e cheia de males, 
é só uma voz entre a verdura! 
– Mas Eva muito séria estava 
e sob o galho ela a escutava!

“Alma, eu lhe disse, doce pouso 
de tanto êxtase condenado, 
não sentes este amor sinuoso 
que foi por mim ao Pai roubado? 
Tenho esta essência celestial 
a fins mais doces do que o mel 
reservado tão suavemente... 
Apanha o fruto... Oh, que se estenda 
a tua mão e, ardentemente, 
te faça dele uma oferenda!”

Que silêncio – o bater de um cílio! 
Que sopro no peito soçobra, 
que a árvore mordeu de sua sombra! 
O outro brilhava qual pistilo! 
– Silva, silva! – ele me cantava! 
E eu sentia fremir as mil 
dobras do meu dorso sutil, 
saindo então do meu abrigo: 
rolaram atrás do berilo 
de minha crista, até o perigo!

Ó gênio! Ó comprida impaciência! 
Eis chegado o instante em que um passo 
em direção à nova Ciência 
fluirá de um fino pé descalço. 
Aspira o mármore, o ouro enjambra! 
Tremem as bases de sombra e âmbar 
na véspera do movimento!... 
Ela vacila, a grande urna, 
de onde emana o consentimento 
dessa aparente taciturna!

Do vivo prazer que antegozes, 
belo corpo, cede aos apelos! 
Que a sede de metamorfoses 
em torno da Árvore dos Zelos 
engendre a cadeia de poses! 
Vem, sem vires! Ensaia passos 
vagos, como ao peso de rosas... 
Não penses! Dança nos espaços... 
Aqui há causas deliciosas 
que bastam ao curso das coisas!...

Oh, quanto é infértil a fruição 
que me ofereço, com demência: 
de ver tão suave compleição, 
fremir em desobediência!... 
Breve, emanando seu sustento 
de sabedoria e ilusões, 
toda a Árvore do Conhecimento, 
esguedelhada de visões, 
no amplo corpo que investe rumo 
ao sol, bebe do sonho o sumo.

Grande Árvore, Sombra das Alturas, 
irresistível Árvore de árvores, 
que os sucos amáveis procuras 
na fragilidade dos mármores, 
ó tu, que os labirintos cevas 
por onde as constrangidas trevas 
se percam no marinho lume 
da sempiterna madrugada, 
doce perda, brisa ou perfume, 
ou pomba já predestinada,

Cantor, secreto bebedor 
das mais profundas pedrarias, 
berço do réptil sonhador 
por quem já Eva tresvaria, 
grande Ser, pleno de saber, 
que sempre, como por mais ver, 
ao alto apelo de teu cimo 
cedes, e ao ouro puro os braços 
estendes, teus esgalhos baços, 
de outra parte, cavando o abismo,

Podes o infindo repelir, 
feito só de teu crescimento, 
e, da tumba ao ninho, sentir 
que és inteiro Conhecimento! 
Mas este velho amante do impasse, 
de uns secos sóis no inútil ouro, 
vem em tua copa enroscar-se – 
seus olhos fremem teu tesouro! 
Frutos de morte, de incerteza, 
de desespero ali sopesa!

Bela serpe, suspensa aos céus, 
sibilo, com delicadeza, 
ofertando à glória de Deus 
o triunfo da minha tristeza... 
Basta-me, nos ares tranquilos, 
que a ânsia do amargo fruto os filhos 
do barro ponha em desvario... 
– A sede que te faz tamanha 
até ao Ser exalta a estranha

Toda-Potência do Vazio!

Giuseppe Torelli~Trumpet Concerto in D (Alison Balsom)


IMA - Mourir dans tes bras


Ima - Et pourtant


quarta-feira, 11 de abril de 2012

G.F Händel/M. Kozena: Se pietà de mi non senti


CELTIC MUSIC - FLUTE


Edith Piaf - L'Effet Que Tu Me Fais



Y a des gens qui savent exprimer
La grandeur de leurs sentiments.
Moi je n'ai aucune facilité.
C'est une question d' tempérament.

Je n' peux pas dire l'effet qu' tu m' fais,
Mais vrai : tu m' fais un drôle d'effet.
Ça commence là, ça passe par là,
Ça continue, et ça s'en va...
Je m'demande où, ça je n' sais pas.
Mais ça revient, et ça remet ça.
Il n'y a qu'un remède pour calmer ça,
C'est quand tu me prends dans tes bras.

T'as dans ta main ma ligne de chance
Et dans tes yeux, mes jours heureux.
On peut bien dire que l'existence
A des moments si merveilleux
Que je m' demande si l' paradis,
Quoi qu'on en dise, est mieux qu'ici.
Si j' pouvais dire l'effet qu' tu m' fais,
Mais vrai : tu m' fais un drôle d'effet.

Si tu veux savoir mon impression,
Notre amour c'est comme un peu d' blanc.
C'est beau l' blanc, mais c'est salissant,
Aussi j'y fais très attention.

Je n' peux pas dire l'effet qu' tu m' fais,
Mais vrai : tu m' fais un drôle d'effet.
Ça commence là, ça passe par là,
Ça continue, et ça s'en va...
Je m' demande où, ça je n' sais pas
Mais ça revient, et ça remet ça.
Il n'y a qu'un remède pour calmer ça,
C'est quand tu me prends dans tes bras.

Crois-tu vraiment qu'on a d' la chance
De nous aimer et d'être heureux ?
Y a tant de gens dans l'existence
Qui voudraient bien être amoureux.
T'as des façons de m' regarder.
Vraiment, t'as pas besoin d' parler
Et si j' te fais l'effet qu' tu m' fais,
Ben vrai, on s' fait un drôle d'effet...

Lully - Bourrée Du Divertissement De Chambord


ANA MOURA - CANSAÇO


domingo, 8 de abril de 2012

Alison Balsom plays Enesco's Legend


Manuel Blanco, Trompeta - Oblivion - Astor Piazzola


Manuel Blanco Gómez-Limón, interpretación con sonido en directo del Tema: Oblivion, Tango del Compositor Astor Piazzola, en el programa emitido el 29/11/2011 titulado, "Programa de Mano" del Segundo Canal de la Televisión Española acompañado al piano por Lorenzo Moya.

Charles-Hubert GERVAIS ( 1671-1744 ) - TE DEUM - LOUIS-MARTINI ( 1957 ) VINYL



Du Caurroy, Eustache: Te Deum



« Henri IV : le roi de réconciliation »
Eustache du Caurroy (1549-1609): Te Deum laudamus
Les Pages, les Chantres, et les Symphonistes du Centre de Musique baroque de Versailles. Olivier Schneebeli, direction
Chapelle Royale du Château Versailles, 11-12-2010

As Valquírias - Wagner


Leila Josefowicz - Camille Saint Saens - Introduction Rondo and Capriccioso


Tudo passa - Santa Tereza D"Ávila



"Nada te perturbe, nada te amedronte
Tudo passa, só Deus não muda.
A paciência tudo alcança
A quem tem Deus, nada falta
Só Deus basta."

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Era - Divano (Paixão de Cristo)


Telemann - Concerto a 6 for Flute & Violin TWV52:e3


GEORG PHILIPP TELEMANN (1681-1767)

Concerto a 6 for transverse flute, violin, strings and basso continuo in E minor TWV52:e3

1. Allegro

2. Adagio

3. Presto - Adagio - Allegro

Performed by Les Boreades
Featuring Francis Colpron, tranverse flute
Manfredo Kraemer, violin

Salisbury Cathedral Choir - Stanford Magnificat in G


Händel: Domerò la tua fierezza (Giulio Cesare) - Filippo Mineccia


Philippe Jaroussky - "Sì dolce è il tormento"



Claudio Giovanni Antonio Monteverdi (1567-1643), "Sì dolce è il tormento" (1624)
Philippe Jaroussky, City Recital Hall, Angel Place, Sydney, July 2007.

Sì dolce è il tormento che in seno mi stach'io vivo contento per cruda beltà...nel ciel di bellezza s'accreschi fierezza et manchi pietà
che sempre qual scoglio all'onda d'orgoglio mia fede sarà...

La speme fallace rivolgami il pièdiletto né pace non scendano a mee l'empia ch'adoro mi nieghi ristoro di buona mercètra doglia infinita, tra speme tradita vivrà la mia fe'...

(Per foco e per gelo riposo non honel porto del Cielo riposo haverò...se colpo mortale con rigido strale il cor m'impiagò
cangiando mia sorte col dardo di morte il cor sanerò...)
Se fiamma d'amore già mai non sentìquel rigido core ch'il cor mi rapìse nega pietate la cruda beltate che l'alma invaghì
ben fia che dolente pentita e languente sospirami un dì...
- Leonardo da Vinci "Virgin of the Rocks".

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Insensatez - Tom Jobim


Recordação - Cecília Meirelles




Agora, o cheiro áspero das flores
leva-me os olhos por dentro de suas pétalas.
Eram assim teus cabelos;
tuas pestanas eram assim, finas e curvas.
As pedras limosas, por onde a tarde ia aderindo, 
tinham a mesma exaltação de água secreta,
de talos molhados, de pólen,
de sepulcro e de ressurreição.
E as borboletas sem voz
dançavam assim veludosamente.
Restitui-te na minha memória, por dentro das flores!
Deixa virem teus olhos, como besouros de ónix,
tua boca de malmequer orvalhado,
e aquelas tuas mãos dos inconsoláveis mistérios,
com suas estrelas e cruzes,
e muitas coisas tão estranhamente escritas
nas suas nervuras nítidas de folha,
- e incompreensíveis, incompreensíveis.

(Cecilia Meirelles)

Saudável Loucura - Fátima Quintas -


Abriu o livro na página certa. Leu o poema e arfou o cheiro da vida. Das palavras saltava a emoção que ela não sabia colocar no papel. Tantas vezes pensou em escrever! Desde pequena, ainda aprendendo o abecedário, seduzia-se pelas palavras, agrupando-as cautelosamente num caderninho especial.
Cedo, captou o mundo com olhos indicadores, interrogou as causas primeiras da existência e jamais se conformou com respostas rápidas e sucintas. Precisava ir além do previsível. Entender o que se passava por trás do aparentemente explicável dizia de uma ação íntima que a perseguia. 
Os adultos entediavam-se com as insistentes perscrutações. E por que isto? E por que aquilo? A infância passou célere na história da menina que sabia muito pouco. Não se cansava, todavia, de investir na sua insistente procura. Agora, adulta, a vida não lhe parecia diferente. Teria mudado alguma coisa? 
A maturidade chegara tão depressa que sequer deu conta que as reflexões aumentavam, dia após dia. Viver é um ato de loucura com riscos que vão se agigantando à medida que a consciência adquire alguma solidez. Melhor apagar do borrão desfocado a história contada e acreditar que o excesso de escrúpulos inibe os ímpetos de transgressão. Como poderia, entretanto, destruir o legado que herdou? 
Os versos falavam de amor. De um amor descompromissado, livre de amarras e de falsos rótulos. Clandestino. 
Apegou-se às palavras como quem se apega aos afogos maternos e fez desse instrumento um caminho de fé. Conhecia a sua Ilhaneza, defendia um pudor que talvez não merecesse a atenção dispensada, no íntimo, repetia ocos ensinamentos que serviram apenas para perfilar sua confusa identidade. 
Fechou o livro, apagou a luz, tentou dormir. Não conseguiu. As horas se passavam, os minutos martelavam o ritmo da irreversibilidade, o escuro do quarto possibilitava a construção de inúmeras fantasias. Deixou fluir o lado onírico. Então revestiu-se de uma energia desconhecida e, de repente, inquiriu-se abruptamente. O que estaria acontecendo? 
Não duvidava. A paixão a tomava por completo. Há muito tempo não se sentira tão bem! Levantou-se. largou os lençóis enxovalhados sobre a cama, pisou na fria cerâmica, correu até o espelho. Achou-se bonita. Confiou num rosto pretérito, jovem, quase adolescente, ainda anestesiado pelas sensações de antigas cartas de amor. Ah, as cartas de amor! Já nem se lembrava da época em que as recebeu. Não fazia mal. Era hora de resgatar os sonhos arquivados. 
O papel em branco a amedrontava. Quem não se atemoriza diante do vazio de uma página virgem de palavras? Apanhou a lapiseira – e reteve o jorro da saudável insensatez. Como é difícil iniciar. Os começos guardam enigmas inenarráveis. Iria dizer o quê? A mão trêmula refletia o nervosismo de quem se conhecia insegura. Com muito esforço, quase ensandecidamente rabiscou a primeira linha. As outras brotaram na volúpia de um dizer escancarado. 
Não quis reler. Cartas de amor não se relêem. Que o grito de sentimento se espalhasse na arritmia das frases desordenadas. A razão contrapõe-se à emoção. E ela não tinha o menor receio de rebentar-se por inteira na travessa paixão. Assinou a carta, fechou o envelope, colocou-o dentro do livro. No correio, prestes a desistir, entregou ao destino a bela carta de amor. 


Fátima Quintas é antropóloga da Fundação Joaquim Nabuco